O primeiro catálogo de sons de peixes na costa de Portugal continental
- Manuel Vieira
- 18 de mai.
- 3 min de leitura
Investigadores realizaram um estudo pioneiro que revelou a diversidade sonora das comunidades de peixes no Parque Marinho Professor Luiz Saldanha, utilizando gravações acústicas (Monitorização Acústica Passiva) e sistemas de vídeo subaquáticos. Esta é a primeira catalogação deste tipo em águas costeiras de Portugal continental, fornecendo dados relevantes para a monitorização da biodiversidade marinha.
A análise de gravações acústicas permitiu a identificação de 33 tipos de sons diferentes que provavelmente são produzidos por peixes. Esta diversidade de sons de peixes é relativamente elevada, sendo superior à registada em alguns outros locais, como o Mediterrâneo ou mesmo alguns recifes de coral. Com base numa revisão da literatura para avaliar o conhecimento atual sobre os peixes nesta região, das 150 espécies de peixes presentes, apenas 29 (menos de 20%) são já conhecidas por produzir sons, evidenciando que a maioria das espécies carece de estudos. A identificação e caracterização desses sons são fundamentais para compreender a ecologia e comportamento dessas espécies e viabilizar a monitorização ecológica por meio da acústica passiva. Este estudo sublinha o grande potencial da acústica passiva como ferramenta de monitorização não invasiva, que poderá permitir avaliar a biodiversidade e os impactos das atividades humanas nos oceanos.
Mas os peixes produzem mesmo sons? Sim! Muitos peixes produzem sons usando diferentes mecanismos, como a vibração da bexiga natatória, o movimento de músculos específicos ou até o atrito entre ossos e dentes faríngeos. Esses sons desempenham várias funções: podem ser usados para comunicação entre indivíduos da mesma espécie, para defesa contra predadores ou para alertar sobre ameaças. Em muitas espécies, os sons são fundamentais durante a reprodução, ajudando a atrair parceiros e a marcar território.
Podemos ouvi-los? Depende da intensidade e da frequência do som. Muitos sons produzidos por peixes situam-se em frequências baixas, o que os torna difíceis de ouvir sem auscultadores. No entanto, são audíveis para humanos, mesmo durante mergulhos em alguns ambientes é possível ouvir sem nenhum equipamento especializado. Os sons podem variar bastante: enquanto o xarroco emite sons graves, rítmicos e intensos, os rascassos produzem sons mais agudos, como "kwas". A maior parte destes sons pode ser captada através de câmaras subaquáticas ou hidrofones, permitindo que os cientistas estudem mais profundamente as comunicações e os comportamentos dos peixes.
No entanto, apesar da crescente evidência científica, a sociedade ainda desconhece amplamente que os peixes produzem sons e que a comunicação acústica desempenha um papel fundamental no seu comportamento. Este estudo reforça a necessidade de sensibilização sobre a importância dos sons subaquáticos e destaca o valor de desenvolver técnicas automatizadas para monitorização acústica da fauna marinha.
Os resultados desta investigação lançam as bases para estudos futuros que possam expandir o conhecimento sobre os padrões acústicos das comunidades piscícolas e integrar a acústica subaquática em programas de gestão e conservação marinha. Este estudo representa um avanço significativo na compreensão dos sons dos peixes e reforça a relevância da acústica na ciência e conservação marinha.
Este estudo faz parte do doutoramento de Noelia Ríos Ruiz do MARE-ispa, e contou com investigadores da MARE-Ciências ULisboa, cE3c, MARDIVE e FishBioacousticsLab, e ainda com a colaboração de alunos IMBRSea.
Artigo:
Ríos, N., Pereira, J., Muñoz-Duque, S., Silva, G., Pais, M. P., Fonseca, P. J., Vieira, M., & Amorim, M. C. P. (2025). Acoustic fish community in a biogeographic transition zone of the Northeast Atlantic. ICES Journal of Marine Science, 82(3), fsaf027. https://doi.org/10.1093/icesjms/fsaf027